Com pouco mais de 40 km de extensão, o Doubtful Sound é um dos maiores dos 14 fiordes neozelandeses. Localizado na parte central da magnífica região do Fiordland National Park e na porção sudoeste da ilha sul da Nova Zelândia, o Doubtful Sound é o segundo fiorde mais visitado de toda a Nova Zelândia.
Composto por pelo menos 5 grandes braços de mar e cercado por enormes paredões de pedras esculpidos pelo gelo nas últimas glaciares ocorridas no Holoceno, o Doubtful Sound cobre uma superfície quase 10 vezes maior que o mais famoso e acessível dos fiordes neozelandeses, o Milford Sound.
Cercado por montanhas que se elevam abruptamente em mais de 1000 metros à partir do nível do mar em diversos pontos ao longo de sua extensão. O Doubtful Sound ostenta também o título de fiorde mais profundo dentre os fiordes neozelandeses. Atigindo em alguns pontos até 421m de profundidade.
Famoso por sua natureza selvagem e praticamente intocada até nos dias de hoje, o Doubtful Sound possui uma fauna rica e diversa. E é coberto por uma exuberante vegetação subtropical que teima crescer sobre as pedras e em muitos casos, parece desafiar as leis da gravidade.
Embora receba menos de 5-10% dos visitantes que visitam o Fiordland National Park. Uma visita de pelo menos 1 dia ao Doubtful Sound é o tipo de passeio inesquecível. E que acaba sendo uma ótima pedida para aqueles visitantes que tem pelo menos 2-3 dias na região do Fiordland e querem explorar um pouco mais deste lado ainda praticamente selvagem da Nova Zelândia.
Esculpido pelas grandes glaciações, os fiordes neozelandeses sempre foram um ambiente inóspito e selvagem à todos aqueles que tentaram o conquistar. Ao longo de quase 5 séculos, os maoris visitaram e tentaram se estabelecer no local algumas vezes. Eles eram atraídos pela farta oferta de comida que o local oferecia, principalmente durante os meses de verão. Porém, sempre acabavam abandonando o local com a chegada dos meses mais frios do ano e suas terríveis tempestades de inverno.
O capitão James Cook foi o primeiro europeu à avistar o Doubtful Sound em 1770. Apesar dele não ter adentrado e explorado o local, em seu diário de bordo ele descreveu a beleza do lugar e batizou a região de Doubtful Harbour.
Segundo seu relato, ele optou por não adentrar no “Doubtful Sound” porque duvidava de sua capacidade de, uma vez dentro do fiorde, conseguir navegar são e salvo de volta para o oceano usando apenas os ventos. Até porque, quando se incursionou pelo interior do Dusky Sound, outro grande fiorde do Fiordland National Park um pouco mais ao sul, algumas semanas antes, passou por sérios apuros.
Apesar dele não explorar esta região do Fiordland em específico. Seus detalhados relatos sobre a rica e abundante fauna da região do fiordes neozelandeses faria com que, algumas décadas mais tarde, dezenas de caçadores de baleias e peles fossem atraídos para a costa sudoeste da Ilha Sul da Nova Zelândia.
Leões Marinhos descansando ao sol no Doubtful Sound na Nova Zelândia
A chegada desses caçadores e baleiros à região, acabou reduzindo drasticamente a população de mamíferos marinhos já no fim do século XVIII. Tanto que hoje, estima-se que a população de leões-marinhos e baleias que vive ou visita a costa da região dos fiordes neozelandeses não seja nem 20-30% do que era quando James Cook navegou por estas águas pela primeira vez. Fico só imaginando como seria esse lugar naquela época…
Apesar de até existir uma estrada secundária de serviço não pavimentada de + -150 km de Manapouri até Wanganella Cove. A qual foi justamente construída no período de contrução da usina hidroelétrica de Manapouri. O Doubtful Sound é, até os dias de hoje, tecnicamente inacessível de carro.
Na verdade, o Doubtful deve ser invariavelmente visitado num tour de barco e / ou helicóptero (se você puder cacifar esse sonho). Até porque, uma vez chegando lá, é apenas da água ou ar que você tem uma real noção do tamanho e beleza desse lugar.
Para o nosso passeio pelo Doubtful Sound acabamos optando pelo passeio oferecido pela Real Journeys, a principal operadora na região. Um inesquecível passeio de barco à bordo de uma embarcação com capacidade para até 45 pessoas que leva os visitantes à explorar as belezas quase inexploradas do mais longo fiorde da Nova Zelândia.
Partindo de Manapouri, o passeio de ida e volta pelo Doubtful Sound leva cerca de 8 horas e meia e te leva a conhecer algumas das paisagens mais bonitas e fascinantes da sua viagem pela Nova Zelândia. Um passeio de tirar o fôlego que “de brinde” ainda te leva conhecer uma das maiores obras de engenharia da Nova Zelândia, a usina hidroelétrica subterrânea de Manapouri.
Como já falei em outro post, a surpreendente travessia do Lake Manapouri que na verdade é a primeira parte desse passeio e que dura pouco mais de 40 minutos. Por si só já impressiona, e faz o passeio praticamente já valer à pena.
Doubtful Sound nos fiordes neozelandeses
Terminada a amostra grátis, quero dizer, a travessia do Lake Manapouri. No nosso tour, ainda visitamos o interior da maior usina hidroelétrica da Nova Zelândia. E aí, só quando concluímos a visita à “Itaipu” da Nova Zelândia, que seguimos de ônibus os 21 Km de estrada de terra da Wilmot Pass que separam da Usina de Manapouri e o Deep Cove do Doubtful Sound.
Em linha reta, a distância entre a Usina hidroelétrica de Manapouri e o Deep Water Cove seria de apenas 10 km. Porém, devido o recortado relevo da região, o trajeto mais que dobra de tamanho. Enquanto isso, a usina hidroelétrica subterrânea fica no meio da montanha.
O trajeto terrestre entre o Lago de Manapouri e o Doubtful Sound através da Wilmot Pass é muito bonito e emoldurado por uma exuberante floresta subtropical e com alguns riachos e cachoeiras dignos de uma foto. Infelizmente, estávamos num tour, e apesar de o ônibus fazer uma parada para umas fotos no alto da Wilmot Pass, essa parte da viagem é digamos a mais chatinha.
Se estivéssemos com o nosso próprio carro, certamente teríamos feito várias paradas estratégicas para tirar fotos pelo caminho. Afinal de contas, essa estrada não deve deixar muita coisa à desejar em termos paisagísticos em relação à famosa estrada para o Milford Sound, a SH-94.
Mas tudo bem, ao chegarmos no divisor de águas da estrada paramos num lookout para apreciarmos por alguns minutos a fantástica vista do vale e seus fiordes ao fundo. Tivemos muita sorte em pegar um dia de sol e céu azul. Afinal de contas, nessa região costuma chover cerca de 250 dias por ano.
Bem, as foto que ilustram esse post dispensam legenda. E creio que, assim como o Milford Sound, durante dias chuvosos o Doubtful Sound também tem seu charme, quando centenas, se não milhares de cachoeiras se formam nas encostas dos fiordes.
De volta ao busão e depois de mais alguns quilômetros morro abaixo, finalmente chegamos ao Deep Cove do Doubtful Sound. Alí embarcamos no barco da Real Journeys para o tão esperado passeio entre os impressionantes paredões de um dos maiores fiordes do hemisfério sul.
Descendo em direção ao Doubtful Sound
Um fenômeno bastante interessante e que ocorre em quase todo fiordland e que fica ainda mais evidenciado nesta região do Doubtful Sound devido à hidroelétrica de Manapouri é o fatio que embora o fiorde seja tecnicamente mar. Como chove muito nesta região (+- 7000 mm anuais), na verdade, nos fiordes neozelandeses, navegamos basicamente sobre água doce e / ou salobra.
Isso acontece principalmente devido a diferença da densidade entre àgua doce e salgada, que aliada à baixa movimentação das águas. Faz com que elas praticamente não se misturem. Tanto que, próximo ao Deep Cove o layer de àgua doce sobre o layer de água salgada do mar chega a quase 25 metros.
Nesse caso específico, isso obviamente bastante influenciado pela descarga das águas da usina de Manapouri que são descarregadas por alí. Atividade que por sinal é bastante contestada por ambientalistas que se opõe firmemente contra a construção de novas turbinas geradoras e ampliação da capacidade geradora. Principalmente depois que foi provado num estudo uma correlação direta entre o declínio na população de golfinhos nariz de garrafa na região depois que a capacidade geradora da usina de Manapouri foi incrementada aumentando a vazão de descarga da represa.
Fora da Deep Water Cove e ao longo dos 40.4 Km do Doubtful Sound até o mar aberto este layer de água doce / salobra tem em média de 4 até 10 metros de profundidade. Situação que se repete em menor escala nos outros 13 fiordes da Nova Zelândia.
Graças a este fenômeno, encontramos na região do Fiordland National Park um ecossistema completamente único. Principalmente no que se refere a biota aquática. Um dos exemplos clássicos e que mais chama atenção da comunidade científica e de mergulho é o aparecimento de colônias de Antipatharia. Antipatharia é uma ordem de corais pertencentes ao filo Cnidaria e que geralmente são encontrados apenas em águas profundas nos trópicos, mas que podem ser observadas em pouca profundidade na região dos Fiordes da Nova Zelândia.
À medida que se navega pelo canal principal do Doubtful Sound e que liga Deep Cove ao Mar da Tasmânia, também chamado de Malaspina Reach, podemos observar absolutamente paisagens incríveis cujas fotos não conseguem transmitir sua escala e grandiosidade.
Um pouco antes de chegarmos ao Pendulo Reach, que conecta o Doubtful Sound a dois de seus principais braços (Thompson Sound & Bradshaw Sound) formando a Secretary Island, avistamos dois navios de cruzeiros navegando pelos fiordes. Como este é o mais profundo e um dos mais largos dos fiordes da Nova Zelândia, várias das empresas de cruzeiros a navegar por essas bandas, geralmente dão uma passadinha por alí em suas viagens entre a Austrália e Nova Zelândia.
Seguindo adiante, temos a enorme Secretary Island à nossa direita. Por alí navegamos passando muito próximo da Te Awaatu Channel Marine Reserve, uma área protegida em que embarcações motorizadas são proibidas de trafegar e onde moram muitos leões-marinhos e golfinhos. Até finalmente chegamos ao encontro do Mar da Tasmânia.
Nesta área de encontro entre o Doubtful Sound e o Mar da Tasmânia, a profundidade do fiorde é menor e por alí existem algumas pedras e pequenas ilhas como Shelter Islands e Nee Islets. Locais que os Leões-Marinhos (New Zealand fur Seals) brincam e socializam em bandos que podem passar de centenas.
Nesta área, geralmente no inverno, é muito comum se avistar também os raros Crested Pinguins do Fiordlands. Infelizmente na época que visitamos o Doubtful Sound eles estavam de férias, provavelmente na Antarctica. Porém chegamos a avistá-los em outra oportunidade em Milford Sound. E tenho que dizer, são lindos!!
Depois de uma volta pela “desembocadura” do Doubtful Sound junto ao Mar da Tasmânia, iniciamos nossa jornada de volta ao Deep Cove. Desta vez, navegando bem próximo à margem esquerda do Doubtful Sound.
Pelo caminho de volta, entramos nos 3 braços existentes deste lado do Doubtful Sound. O primeiro deles foi o mais curto, chamado de First Arm onde conseguimos avistar alguns golfinhos. Adiante, demos uma rápida entrada no Crooked Arm que impressionou com seus paredões de pedra.
Como ao longo do dia, o vento aumentou consideravelmente acabamos “não curtindo” o último destes braços. Conhecido como o Sound of Silence, devido a sua geralmente ausência de vento e barulho, ele não estava tão silencioso assim.
Mesmo assim, esta foi na minha opinião uma das partes mais bonita do passeio. Afinal de contas com o Commander’s Peak elevando-se em 1258 metros logo na entrada deste fiorde, sua primeira reação certamente será um Ual!!
No interior do Sound of Silence encontramos também a mais alta das cachoeiras do Doubtful Sound, a Browne Falls com impressionantes 619m de altura. Porém como estava sem chover por alguns dias, a quantidade d’água caindo por ela durante nossa visita ao fiorde era mínima. Com a queda, a água praticamente virava névoa antes de encontrar as àguas na base do fiorde. Mesmo assim é impressionante.
E para finalizar o passeio, antes de chegarmos de volta à Deep Cove, ainda passamos muito próximo a uma pequena ilhota com algumas Ratas florindo. As Ratas são uma espécie de Pohutukawa endêmicas da ilha sul da Nova Zelândia que quando estão floridas, dão um charme todo especial à paisagem.
Desta ilhota, seguimos então adiante em direção ao atracadouro de Deep Cove. E à medida que nos aproximávamos dali podemos observar, mesmo que de longe, um pouco da Helena Falls. Uma cachoeira perene com quase 220 m de altura que dispenca para o interior do Deep cove numa área próxima a área de descarga das águas da usina hidroelétrica de Manapouri. E assim terminamos o passeio de barco pelo belíssimo Doubtful Sound.
Embarcamos de volta no ônibus e seguimos toda a jornada de volta pelos 21 km da Wilmot Pass, com uma rápida parada num mirante para umas fotos da Helena Falls e seguimos em direção ao píer da usina de Manapouri para iniciarmos a travessia de volta pelo lake Manapouri de volta à pequena cidade de Manapouri onde havíamos deixado nosso carro estacionado.
Uma passeio fenomenal que um dia adoraria repetir explorando parte dessa maravilha num kayak e / ou à bordo de um helicóptero para observar as belezas intocadas desse lugar sob uma diferente perspectiva. Você algum dia já visitou um fiorde? Onde foi? Conte ai para gente na caixa de comentários!
Veja os comentários
Ual!!! Que lugar mais lindo! A Nova Zelândia não para de me surpreender!! Suas postagens sobre o país são magníficas e as fotos então, de tirar o fôlego.. Parabéns e continue postando sobre essas maravilhas que vocês visitam pelo mundo
Obrigado Isa..
E pode ficar tranquila que continuarei a postar sobre nossas viagens e experiências por esse mundão :d
Bjs
Gostei muito do post, as fotos estão lindas!
Legal que você gostou :D
Bjs
Ola Oscar, parabens pelo blog!!adorei!
estou muito em duvida sobre qual fiorde visitar em janeiro. Milford ou Doubtful Sounds.
Estarei de carro com meu marido e tb estamos em duvida sobre ir de carro ou reservar tour completo.
Vi que vc mencionou kayak! Que duvidaaaa, vc pode nos ajudar?
Obrigada
Gabriela
Olá Gabriela
Então os dois fiordes são lindos.. O Milford é sem dúvida o mais famoso e provavelmente o mais impactante por ter encostas mais verticais. O Doubtful é o mais selvagem e menos explorado só que muito maior que o Milford.
Podendo visitar os dois eu recomendo. Lembrando que os passeios no primeiro tendem a ser mais baratos que o segundo jia que geralmente duram meio dia enquanto o Dobtful tendem a ser o dia todo.
Eu recomendo pernoitar 1-2 noite em Te Anau, ir de carro de Queenstown para Milford Sound é cansativo, principalmente para voltar no mesmo dia e como já escrevi neste post. A viagem de Te Anau para Milford Sound já é uma atração por sí própria.
O passeio de Kayak é fantástico, eu fiz 2 vezes e adorei, mas tem que ter um certo preparo fisico..
Ahh só mais uma coisa, se for fazer alguma trilha la em fiordland nessa época do ano recomendo levar repelente.. As Sandflies são ferozes nessa época do ano :D
Abs